Consideramos osteomielite toda infecção que acomete o tecido ósseo. Tal afecção causa grande apreensão nos pacientes devido a sua significativa morbidade, entretanto as taxas de mortalidade decorrentes de tal patologia são mínimas.
Sabemos que 5 a 10% das fraturas expostas e menos de 1% das fraturas fechadas tratadas cirurgicamente com material de síntese interna (Placas, Hastes e próteses) evoluem para osteomielite.
A osteomielite pode ser:
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Aguda
Episódios iniciais com menos de 30 dias de evolução. -
Subaguda
Sintomas pouco definidos, dados laboratoriais pouco representativos e alterações radiológica presentes. -
Crônica
Recidivas de casos agudos, ocorrendo com mais de 30 dias.
Causas
Hematogênica: A infecção, cujo foco está localizado em outra parte do corpo, é transportada pela corrente sanguínea e acaba se alojando no tecido ósseo. Esta forma é mais frequente em crianças.
Pós-traumática: Infecção ocorre no momento do trauma ou após um procedimento cirúrgico.
Durante uma fratura exposta temos a quebra da barreira protetora (pele), colocando o osso em contato com o meio externo contaminado ocasionando infecção local.
Sintomas
O sintomas podem variar significativamente dependendo da idade e condições clínicas do paciente.
- Dor;
- Calor;
- Vermelhidão local;
- Edema;
- Febre e calafrios (mais comum em crianças);
- Fístula com secreção purulenta.
Os sintomas não estarão todos presentes ao mesmo tempo, sendo na maioria das vezes o aparecimento de uma fístula com secreção purulenta o único sinal da doença.
Importante ressaltar os aspectos psicológicos desta doença, pois muitas vezes essas fístulas apresentam odor fétido levando o paciente ao afastamento do convívio social.
Diagnóstico
Sinais clínicos.
Exames de imagem: Raio X simples, fistulografia, cintilografia óssea, tomografia computadorizada ou ressonância magnética e etc.
Os métodos diagnósticos são escolhido conforme a história e situação clínica podendo variar entre os pacientes.
Tratamento
Quando possível devemos isolar e detectar a bactéria causadora do quadro infeccioso. Muitas vezes é necessário a suspensão do antibiótico por alguns dias antes do procedimento, o que gera uma certa apreensão nos pacientes por ir contra o conhecimento popular de que diante de uma infecção não devemos parar tal medicação. Esta conduta só é possível devido as particularidades do tecido ósseo que faz com que tal infecção raramente evolua para um comprometimento sistêmico (Infecção generalizada).
Durante o procedimento cirúrgico realizamos a coleta de tecido ósseo que esteja em contato com a infecção para realizarmos exame cultural e antibiograma, pois coletar material diretamente da fístula pode levar muitas vezes a um erro diagnóstico detectando germes da flora bacteriana da pele.
Após isolado o agente causador e encaminhar esse material para análise (que geralmente demora aproximadamente 5 a 7 dias para sair o resultado), continuamos com o procedimento cirúrgico para realizar o desbridamento com remoção de todo tecido ósseo comprometido e retirada de material de síntese interna (placas, parafusos, hastes, próteses e etc). Neste período iniciamos antibiótico empírico (baseado nos agentes causadores mais comuns nessas infecções), após sair o resultado dos exames alteramos os medicamentos caso necessário.
Nos casos mais resistentes alguns profissionais irão indicar amputação do membro, entretanto muitas vezes podemos evitar tal conduta ao realizar a ressecção de somente a região comprometida e realizar um transporte ósseo (alongamento ósseo) para preencher a falha.
Por que é preciso retirar os implantes cirúrgicos em casos de oteomielite crônica?
O contato das bactérias com os implantes leva a formação de biofilme na superfície destes gerando um dos maiores desafios para o tratamento efetivo. O biofilme é uma camada protetora formada pelas bactérias que funciona como um escudo protegendo as contra células de defesa e antibióticos, sendo assim nestas situações torna-se necessário a retirada de todo e qualquer material de síntese interna (placas, parafusos, hastes, próteses) para realizarmos a remoção de todo o biofilme.
Por que é tão difícil tratar a osteomielite?
O osso é composto por 30 a 35% tecido orgânico e 65 a 70% tecido inorgânico.
Devido à grande quantidade de material inorgânico, baixa vascularização e pelo metabolismo diferenciado, tal tecido apresenta dificuldades de atingir uma concentração adequada de antibiótico.
A baixa concentração de antimicrobianos neste tecido propicia a uma alta taxa de falha no tratamento quando não associada ao procedimento cirúrgico para remoção de todo tecido desvitalizado e contaminado.
Infecção óssea após um procedimento cirúrgico, de quem é a culpa?
Difícil precisarmos de quem é a culpa, pois todos cirurgiões são treinados exaustivamente para seguirem protocolos que minimizam o risco de tal acontecimentos e os hospitais são obrigados a exigir de seus funcionários rigor no processo de esterilização dos materiais.
Nos hospitais onde eu opero todos profissionais que trabalham no bloco cirúrgico (médicos, técnicos de enfermagem, enfermeiros, higienizadores e etc.) são treinados para seguir os protocolos. Todo material esterilizado ao ser aberto antes do ato cirúrgico apresenta testes que nos dão informações sobre a qualidade do processo de esterilização. Caso o teste indique que houve falha no ciclo de esterilização do material o mesmo é enviado para realizar novo ciclo.
Existem condições clínicas que baixam a imunidade do paciente como a desnutrição e algumas patologias que podem aumentar os riscos de infecção pós operatória.
Diante de tantas variáveis é difícil saber de quem é a culpa de uma infecção, sendo que nessas situações o mais importante é conhecer a fisiopatologia para optarmos pelo melhor tratamento possível.
Referências:
- Lima ALLM, Zumiotti AV. Aspectos atuais do diagnósticoe tratamento das osteomielites. Acta Ortop Bras.1999;7(3):135–42.3.
- Lew DP, Waldvogel FA. Osteomyelitis. Lancet. Lancet.2004;364(9431):369–79.
- Gledhill, R.B.: Subacute osteomyelitis in children. Clin Orthop 96: 57- 69, 1973
- Jones, N.S., Anderson, D.J. & Stiles, P.J.: Osteomyelitis in a general hospital. J Bone Joint Surg [Br] 69: 779-783, 1987.
- King, D.M. & Mayo, K.M.: Subacute hematogenous osteomyelitis. J Bone Joint Surg [Br] 51: 458-463, 1969.